Passamos uma grande parte da vida tentando agradar os outros. Aprendemos ainda crianças, que nosso comportamento educado, respeitoso e gentil nos fará mais amados. Espanta-me a criação que os pais atuais oferecem para seus filhos, o que faz com que eles se tornem pequenos déspotas. Mas confesso que no fundo, uma pontada de inveja me ronda. Apesar de “mal educados”, com certeza eles são mais livres.
Lidar com o “não” ao longo da vida é um desafio e tanto. Penso que o “não” nasceu comigo, ouço-o desde pequena e, mesmo quando o contrário pesa-me a culpa. Por outro lado, a constante argumentação me fez crescer questionando meu próprio comportamento. Posso dizer o que eu quero? Quando eu quero? Para quem eu bem entender? Minhas atitudes devem manter-se equilibradas para não ferir as outras pessoas mesmo que elas mereçam? E o que dizer do outro para comigo?
Enquanto questionadora fui crescendo com a idéia de que o “não” pode muitas vezes representar um “sim” insistente, ou um “sim” magoado. Assim, percebi que por mais certa que eu esteja sempre é melhor parar, respirar, contar até 10 e deixar pra lá… Por quê? Para não magoar e ofender… Ou seja, sinceridade, franqueza e verdade são atitudes não aceitas pela maioria das pessoas como corretas. Dessa forma é que a gente aprende a ser hipócrita.
“Ama ao próximo como a ti mesmo” – analisando esse ensinamento fico ainda mais confusa… Então quer dizer que é preferível mentir e omitir, deixar de falar o que se pensa para que o outro se sinta mais amado? Desculpe… Isso não serve pra mim. Quando eu amo, eu amo inteiro. Não sei agir pela metade… Amar pra mim significa poder dizer qualquer coisa para o outro desde que seja dito com amor, ternura e respeito. Amar é se mostrar, abrir o coração, afinar as diferenças…
Contudo, tem sempre aquela situação em que você não pode dizer o que pensa para não ser taxada de inoportuna, intransigente, amarga e chata. Ou seja, o ofendido nunca vai analisar a sua própria conduta, ele é claro, vai preferir se vitimizar. E eu pergunto: isso é amor?
Tem aquela outra situação em que você prefere o silêncio por amor. Ou seja, deixa de falar tudo o que pensa, opta pela distância para “não” magoar. Porém, essa atitude nem sempre é compreendida… Mais uma vez, seu interlocutor pode acusá-lo de egoísta, orgulhoso e insensível. O que é amor então nessa situação quando sua opinião pode deixar o outro ainda mais angustiado? Amor nesse caso é ficar calado e abraçar o erro a dois? Ou deixar que o tempo se encarregue de mostrar a verdade e afastar-se?
Lembro que ainda quando eu estava na faculdade, meu professor de filosofia nos lançou um desafio: “_ Vocês vão passar 24 horas sem dizer a palavra ‘não’. Depois desse período a gente se reúne novamente e analisa o resultado”. Para resumir as confusões desse dia, o moral da história era simplesmente aprender a dizer “não”. A perceber que “não” estamos na vida a passeio, que recursar-se a compactuar, mentir, omitir e silenciar é um direito que temos para com a gente mesmo, uma proteção aos próprios limites do ser. Isso se chama AMOR PRÓPRIO… E a esse amor devemos ser leais. Só nos amando e nos respeitando podemos então “Amar ao próximo como a nós mesmos”.
Muitas vezes, pagamos um preço bem alto pela nossa franqueza e sinceridade, mais alto ainda pelo nosso silêncio… Mas faz parte da vida as perdas e ganhos que obtemos como “prêmio” pelo nosso comportamento. Contudo, amar a si mesmo nos oferece o maior de todos os presentes: a consciência de ter vivido uma história inteira com paz interior, com a certeza de termos sido verdadeiros quando pudemos amáveis, silenciosos e gentis quando a situação nos obrigou. O que também nos dá a certeza de ter compreendido o real significado do mandamento: “Ama ao próximo como a ti mesmo”.
Escrito por: Eliege Signorelli